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Santa-cruzense relata como a Irlanda enfrenta a pandemia

Rodrigo Concatto Paz, morador de Dublin, diz que país começa a entrar no “novo normal”

Ricardo Gais
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Rodrigo disse ter sentido medo no início da pandemia, por se tratar de uma doença nova – Arquivo pessoal

Embora a pandemia de Covid-19 ainda esteja se alastrado pelas Américas, inclusive no Brasil, outros países que foram afetados muito antes, como é o caso da Irlanda, que fica no continente europeu com 4,9 milhões de habitantes, aos poucos já estão voltando com as atividades em diversos setores. No entanto, as medidas de higiene e prevenção para o enfrentamento da pandemia ainda são fortemente praticadas no país.

Quem relata a situação atual do país europeu é o santa-cruzense Rodrigo Concatto Paz, de 30 anos, que mora há um ano com seu marido na capital Dublin. Atualmente, por dados da Organização Mundial da Saúde (OMS), o país registra 26.162 casos de coronavírus, sendo que desses, apenas 2.162 casos continuam ativos, ou seja, quase todos já estão recuperados. O país também registrou 1.763 óbitos.

Riovale Jornal – Atualmente, como está a situação da pandemia de Covid-19 na Irlanda?

Rodrigo Concatto Paz – Agora a propagação do vírus está bem controlada aqui. O número de mortes reduziu muito, inclusive não sei lhe dizer quando ocorreu o último óbito aqui na cidade de Dublin. Mas os casos registrados estão bem baixos também, em alguns dias não é confirmado caso algum. Na Irlanda inteira, estamos numa faixa de 20 casos registrados por dia. Por isso, já estamos voltando ao normal por aqui. Assim como tem locais abrindo, outros não abriram, como o McDonald’s, que se tiver duas lojas próximas, apenas uma pode abrir e as pessoas não podem consumir o alimento dentro do estabelecimento, apenas fazer o pedido e devem consumir em casa ou outro lugar. As lojas de roupas não deixam a pessoa experimentar a peça, tem que comprar o que tu queres e vestir em casa e se precisar trocar então tem que levar na loja. Alguns bares também abriram, mas tem uma série de regras: o cliente apenas pode consumir bebida alcoólica se consumir um alimento também, caso contrário, o pub pode ser multado. Por isso muitos bares não abriram ainda. Já no meu ramo de trabalho que é a hotelaria, o nosso hotel abriu em 6 de julho, mas eu ainda não voltei a trabalhar, pois o movimento está reduzido. Dos 304 quartos disponíveis, apenas uma média de 100 são ocupados, por isso volto a trabalhar em setembro, já que o hotel não precisa de um grande número de funcionários no momento devido às restrições. Os cinemas também continuam fechados, mas já foi avisado que quando voltarem a abrir, as salas terão limite de pessoas e haverá um espaço entre as poltronas, para que as pessoas não fiquem próximas umas das outras. A nossa saída da quarentena foi dividida em etapas, na primeira fase foi permitido que as pessoas saíssem de casa. No entanto, o comércio não essencial ainda estava fechado, por isso, as pessoas optavam por ficar em praças, mas tinha que se cumprir uma série de regras como o limite de quatro pessoas por grupo. Atualmente as pessoas não vão mais tanto nas praças, pois o comércio está abrindo com horário e número de funcionários reduzidos. Já em relação aos hospitais, agora estão normais, mas teve uma época, no início da pandemia, que estavam cheios e até chegaram a usar alguns hotéis próximos para hospedar pessoas com outros problemas de saúde considerados leves, para não se contaminarem com o vírus no hospital, e apenas as pessoas mais graves de fato ficavam no hospital.

Governo local instalou placas com vários idiomas para orientar a população, inclusive os brasileiros – Arquivo pessoal

RJ – Você sentiu medo em algum momento da pandemia?

Rodrigo – No começo, sim! Porque era algo novo e a gente não sabia como chegaria até a gente, porque o vírus estava se espalhando muito rápido e os números aumentavam todos os dias. Logo começou o isolamento social e com isso tive medo de receber visita em casa e até mesmo de ir no mercado já que tinha que pegar nos produtos. Mas o meu maior medo foi no começo da pandemia quando era tudo novo. Atualmente, higienizando as mãos, usando máscara e evitando a proximidade com as pessoas se tornou algo mais tranquilo, por termos um parâmetro melhor do que está acontecendo, o que a gente não tinha antes.

RJ – De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS) quase todos os casos de coronavírus estão recuperados na Irlanda. O que você acha que levou a este número positivo?

Rodrigo – Eu acho que como teve bastante contenção para que o número de casos diminuísse, eles (médicos) conseguiram dar atenção para as pessoas que estavam sendo infectadas e precisavam de ajuda naquele momento. Aqui em Dublin não ficou tão sobrecarregado, mas foi difícil para o pessoal da saúde, pois vimos muitos enfermeiros sendo discriminados, pois as pessoas estavam com medo de serem infectadas pelo vírus. Mas aqui as pessoas receberam atendimento nos hospitais de forma correta, até onde eu sei, pois não ouvi falar em pessoas que tiveram o atendimento recusado e as pessoas foram atendidas conforme a necessidade. Acredito que o isolamento social ajudou bastante para que se chegasse neste número.

RJ – O governo local tomou medidas severas para conter a pandemia?

Rodrigo – Sim! O governo fechou tudo, até farmácias, mas que puderam operar com horário bem restrito e atendendo uma pessoa por vez e a população não podia comprar qualquer coisa, só o básico e um item por pessoa. O mesmo ocorreu com os mercados, pois logo no começo da pandemia as pessoas começaram a estocar as coisas. Até um mês atrás estava tudo fechado ainda, começou a abrir nestes últimos dias. Essa foi uma das medidas mais severas que o governo solicitou, que todos ficassem em casa. A gente não tinha autorização para sair de casa mais do que uma vez por dia e não podia sair para fazer coisas que não fossem essenciais. Até pediram para que evitássemos consultas médicas. Quando começaram a afrouxar as medidas, a gente podia sair de casa uma vez por dia para fazer exercícios até dois quilômetros da residência, que depois aumentou para cinco quilômetros. A polícia ajudou no controle da quarentena através das placas dos automóveis onde verificava se a pessoa estava longe de sua casa, e se estivesse, realizava perguntas para saber o que a pessoa estava fazendo. O transporte público apenas podia ser utilizado por pessoas que faziam algum trabalho essencial. Foi tudo gradual, nada tomado no impulso.

RJ – As pessoas cumpriram com as regras da quarentena?

Rodrigo – Nossa quarentena começou em março quando o número de casos estava bem alto, então o governo mandou fechar tudo e pediu que as pessoas ficassem em casa sem receber visitas. Com o passar do tempo liberaram que as pessoas se visitassem, mas apenas uma ou duas pessoas, o que acontece até o momento. Caso alguém queira fazer alguma festa em casa o limite é de dez pessoas. No entanto, no começo da pandemia não podia ser realizada qualquer festa, e isto as pessoas respeitaram muito. Claro que tinha algumas pessoas que faziam alguma festa, mas vizinhos denunciavam e a polícia era acionada, mas foram poucos os casos e muitas pessoas continuam respeitando estas regras de distanciamento. Um exemplo é o do meu marido que voltou para a academia – que abriu faz um mês – e o aluno deve higienizar o equipamento antes e depois do uso e as pessoas respeitam muito o espaço de cada um. Nos dias atuais todas as pessoas já podem utilizar o ônibus, mas com máscara e só pode sentar uma pessoa por fila. Apesar do afrouxamento das medidas, ainda temos que respeitar algumas coisas, como por exemplo, na entrada dos supermercados onde tem uma pessoa higienizando as mãos dos clientes com álcool gel e se o espaço está cheio temos que esperar do lado de fora. Ou seja, as pessoas ainda estão cumprindo muito bem as regras por aqui.

Rodrigo mora com seu marido Cassiano há um ano na capital Dublin – Arquivo pessoal

RJ – Como o governo forneceu ajuda para a população?

Rodrigo – O governo criou um plano de ação para ajudar as pessoas afetadas pela Covid-19. É uma ajuda muita boa no valor de 350 euros (R$ 2.150,77) pagos semanalmente pelo governo, que a pessoa recebe para ficar em casa enquanto não está trabalhando. Mas com a retomada das atividades o governo não está mais pagando o auxílio para as pessoas que voltaram a trabalhar. A última data deste pagamento está marcada para abril de 2021. O governo está disposto a ajudar e o povo considera o governo como um “pai”, pois está ajudando todos que foram afetados pela pandemia. Para receber este auxílio não foi nada burocrático, foi bem simples e o pagamento é sempre em dia, sem atrasos.

RJ – A Europa estava sendo muito castigada pela Covid-19, chegou a ser o novo epicentro da pandemia, mas agora o novo epicentro são as Américas. Como você analisa a situação do Brasil?

Rodrigo – Acredito que as medidas impostas por aqui desde cedo deram resultado e as pessoas realmente levaram o vírus a sério e não pensaram que era algo fictício ou tática política, caso este que está acontecendo no Brasil. Aqui as pessoas queriam conter o vírus. A consciência das pessoas é de combater essa pandemia e que não se trata de um vírus político inventado pela China.

RJ – E para finalizar, em Santa Cruz do Sul a grande maioria da população não está levando mais tão a sério a pandemia, e o resultado foi na explosão no número de confirmações no mês de julho. No entanto, o município ainda está conseguindo controlar a situação com medidas mais severas como a multa para quem participar de aglomeração. Qual recado você deixa para os santa-cruzenses?

Rodrigo – Eu acho que as pessoas devem levar o vírus a sério. Que as pessoas sigam as orientações dos órgãos de saúde constantemente para evitar o contágio e como se trata de algo novo, novas descobertas vão surgindo. Temos que enfrentar o vírus como de fato ele é, lavar as mãos constantemente, usar a máscara e cuidar um da saúde do outro.