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O que tem que ser traz força

Na Folha de terça, 10 de setembro, dei-me conta de que a velha sinagoga paulistana Bet-El,  ainda frequentada nos 1990, vai se tornar museu, cuja inauguração está prevista para 2015. Em 2004, o prédio foi dado em comodato para a Construção do Museu Judaico de São Paulo. Recordo-me de ter sabido, na época, pela boca assustada de José Celso Martinez Correia do Oficina, no Bixiga- vizinho do antigo templo- que alguma coisa aconteceria. Circulava o boato da demolição e surgimento de outro centro de compras “espetacular”: um horror para o Teatro.
 Neste setembro pré-primaveril- que delícia aqui em Santa Cruz do Sul das flores! – a Casa de Orações, na Rua Martinho Prado, encontra-se coberta de poeira e entulhos. Apenas os vitrais e a imponente arquitetura testemunham a fé religiosa de tantos filhos de Abraão, Isaac e Jacó frequentadores de shabats e datas festivas: páscoa judaica (Pessach), dia do perdão (Yom kippur), Ano Novo (Hoshashanah)…. Entre muitos, o ex-ministro Celso Lafer, professor de Direito Internacional da USP.
 A comunidade judaica paulistana, muito fechada por motivos tristemente públicos e notórios, pretende se abrir a todos. Há mais de cinco mil peças no acervo: jóias, utensílios domésticos e – talvez o mais importante- talheres utilizados em Auschwitz, o principal campo de concentração, na Segunda Guerra.
Toda Semana da Pátria (dias atrás) torno a ler “Pátria Minha”, de Vinícius de Moraes. Sei lá quantas vezes declamei o poema com gosto de saudade indefinida, que jamais soube de cor.  Leio e releio e reinterpreto ao sabor de emoções inéditas. “… minha pátria é como se não fosse, é íntima. Doçura e vontade de chorar; uma criança dormindo é minha pátria. Por isso, no exílio, assistindo dormir meu filho, choro de saudades de minha pátria”…
Arte é semente em terra boa, como diz Jesus aos discípulos, na famosa parábola do semeador (Mt.13, Mc4) . Certeza certa de que é centelha de eternidade. Por falar nisso, também me lembrei de Shakespeare. Para ser mais exata, de Hamlet: “ser ou não ser, eis a questão…”  Por conta do “politicamente correto”, minha gente, que tem que ser interpretado cum grano salis: pegando leve. 
Algumas vezes há exageros….. Mas existem palavras que têm de jazer no cemitério das amaldiçoadas. Bem ao pé da Dona Ortografia Etimológica e outros bolores. Judiar, judiação, judiaria, por exemplo. Pronunciadas sem malícia por quem ignora o real significado; apenas outro sinônimo patropi de maltratar, causar dor…
No Museu Judaico, perto do Oficina de tantos históricos protestos e arte de primeira, um caderninho de uma guria de 14 anos narra os sofrimentos de seu povo, na Segunda Guerra (1939-1945).
Durante os últimos meses, as obras da velha sinagoga- orçadas em quase trinta e cinco milhões de reais- estiveram suspensas. Falta de recursos.  Agora seguirão de vento em popa. Graças ao Ministério das Relações Exteriores da Alemanha.
Rezemos pela paz na Síria. Pela paz do mundo.

* Monja do Mosteiro da Santíssima Trindade; escritora ([email protected])