Início Geral Aumentam casos de violência contra a mulher

Aumentam casos de violência contra a mulher

Delegada Lisandra: “Houve uma gravidade, principalmente pelo descumprimento de medidas protetivas de urgência (MPUs)”

Mesmo com o aumento dos índices de feminicídios em território gaúcho, com acréscimo de 55,6% no mês de abril, conforme dados divulgados pela Secretaria de Segurança Pública do Rio Grande do Sul, em Santa Cruz do Sul não ocorreu registro neste sentido, segundo a delegada de polícia, Lisandra de Castro de Carvalho, responsável pela Delegacia Especializada no Atendimento à Mulher (DEAM).


“Nenhum caso de feminicídio foi registrado desde o início do ano em nosso Município. O que percebemos foi o aumento da gravidade de ocorrências de violência contra a mulher e para isso tomamos medidas repressivas com o pronto-atendimento e representação através de prisão preventiva contra os acusados. Em cerca de um mês tivemos em torno de 10 prisões efetuadas. Esse número é bem considerável.”

A pandemia pode ser um dos fatores que colaboraram para os índices, pois existe a falta de emprego e por estarem sem condições financeiras. “Realizamos prisões, o que não acontecia anteriormente com tanta frequência, principalmente pelo descumprimento de medidas protetivas de urgência (MPUs). A falta de respeito que o acusado tem em relação às determinações que o juiz impõe colaboram para este aumento. Eles descumprem, ameaçam e, por isso, o aumento de casos. Esta é uma prática criminosa recorrente, crime de perseguição, novo em Código Penal mas uma conduta que já vínhamos enquadrando em outros crimes, tais como ameaça e perturbação da tranquilidade que era uma contraversão penal. Hoje, a lei enquadra como crime, com pena maior de perseguição, a ameaça que se configura na procura do agressor pela vítima no trabalho, de não aceitar o término do relacionamento, vigiar os lugares que ela frequenta e mandar mensagens recorrentes”, frisa.

Nos últimos tempos foram realizadas prisões preventivas nesse sentido, configurando um aumento diário no número de ocorrências. No total, até o momento, foram quatro casos de perseguições; quatro de assédio sexual; dois por atos obscenos; 34 por perturbação da tranquilidade; 65 vias de fatos; sete por estupro; 50 por descumprimento de medidas protetivas de urgência; 87 por lesão corporal e 181 por ameaças, totalizando 434 ocorrências. Desses foram feitos 271 registros na Delegacia de Polícia de Pronto Atendimento (DPPA); 96 na DEAM; 38 no Disque Denúncia pelo 100 ou 180; 60 na Delegacia On-line e 20 por outros meios. “O registro pode ser feito na DPPA, onde existe a Sala das Margaridas, que atende 24 horas, durante a noite e finais de semana. Durante o dia, de segunda a sexta, das 8h30 às 12h e das 13h30 às 18h, na Delegacia da Mulher, onde também temos a Sala das Margaridas”, destaca Lisandra.

Quanto ao perfil dos agressores, a delegada explica que a maioria perfaz aqueles que não aceitam o término do relacionamento. “São os que insistem em reatar, temos também o uso de álcool e substâncias entorpecentes que contribuem com a agressividade. Aqui na DEAM há o atendimento psicológico, antes mesmo do registro da ocorrência, que é um trabalho de acolhimento, orientação e filtro das informações a serem repassados ao policial para o efetivo registro. E, nos casos que não são criminais, são dados os devidos encaminhamentos. Trabalhamos em parceria com o Escritório da Mulher, localizado no mesmo prédio da DEAM, no Centro Integrado de Segurança Pública. São dadas as devidas orientações e esclarecidos os fatos mesmo que paralelamente haja uma investigação policial, pois existem os caminhos percorridos na esfera cível como a separação, definição de guarda, pensão, enfim, tudo deve ser buscado quando do término da relação. Este acompanhamento psicológico tem contribuído muito para a diminuição da violência doméstica”.

Paralelo ao atendimento psicológico, a delegacia também conta com um grupo reflexivo com os agressores. “Estava parado devido à pandemia, mas retomamos em parceria com o Poder Judiciário em que o juiz encaminha para nós e eles passam pelo atendimento com a psicóloga. Outro é o Núcleo de Mediação de Conflitos, que busca a aplicação do apaziguamento, configura os casos mais leves com análise de perfil e que permite a composição para encaminharmos para mediação. Dependendo do crime não cabe a retratação, o retirar a queixa. No crime de ameaça tudo é analisado, nestes casos é dado um grande suporte através do nosso setor de Psicologia”, ressalta a delegada.

Um grande passo será dado futuramente no que se refere à diminuição dos registros de violência contra a mulher. “Existe uma lei que trata da inclusão do tema no currículo escolar. As instituições de educação infantil e ensinos fundamental e médio passarão a abordar conteúdos sobre o enfrentamento à violência contra a mulher. Apostamos neste novo passo para desmistificar e romper com a cultura machista, para que o futuro de nossa sociedade já venha com o aprendizado de como acontece a violência doméstica, quais as formas de denúncia e como atinge os filhos. Ainda mais agora que a família está mais em casa devido à pandemia. Iremos capacitar professores com material sobre o tema”, enfatiza. A Lei nº 14.164, publicada no dia 11 de junho deste ano, traz a norma que altera a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional e também institui a Semana Escolar de Combate à Violência contra a Mulher, a ser realizada todos os anos, no mês de março. A lei foi sancionada pelo presidente Jair Bolsonaro

DEMAIS NÚMEROS

O comparativo em relação ao número de ocorrências registradas mostra que de janeiro a maio de 2020 foram 527, e no mesmo período deste ano foram registrados 613, configurando aumento de 86 casos. Com a vinda da pandemia do coronavírus em 2019, o ano contabilizou 1.468 ocorrências e, em 2020 foram 1.335. De janeiro a maio de 2020 foram feitos 235 pedidos de MPUs, esse índice no mesmo período de 2021 caiu para 225, ou seja, 10 a menos. Quanto às respostas de pedidos de medidas protetivas de urgências em 2021, a DEAM, até o momento, enviou 11 para a Comarca; indeferiu 58 e deferiu 112. Dados também perfazem os flagrantes e as prisões preventivas pela DEAM, sendo 13 flagrantes e 12 prisões preventivas.

NO RS

O resultado no RS sobre o aumento dos feminicídios mostra uma oposição à redução histórica ocorrida em março, além de indicar a necessidade de avanços em termos de proteção e respeito às mulheres. O número de vítimas de assassinato por motivo de gênero no Rio Grande do Sul subiu de nove, em 2020, para 14, em 2021.

Em estudo realizado pela Polícia Civil Gaúcha, das 14 vítimas, apenas duas estavam amparadas através das MPUs, ou seja, para 85% das vítimas não havia determinação judicial para afastamento do agressor. O dado é semelhante ao identificado no Mapa dos Feminicídios 2020, no qual a Polícia Civil verificou que o número chegava a 93,7% das 79 vítimas. Segundo o mesmo estudo, 82% das mulheres mortas no ano passado nunca registraram ocorrência contra o agressor. Entre as vítimas de abril deste ano, o índice foi de 50%, indicando um aumento no registro de ocorrências. O estudo dos crimes ocorridos no ano passado também ressalta a importância de se estar atento para auxiliar as mulheres a se libertarem de contextos violentos. De acordo com os dados do mapa, 70% dos feminicídios em 2020 ocorreram na residência da vítima ou do agressor, ao passo que 82% são classificados como íntimos, ou seja, os autores eram companheiros ou ex-companheiros da vítima.

Apesar da alta de abril, o número de feminicídios no acumulado desde janeiro segue abaixo do registrado no primeiro quadrimestre de 2020, passando de 36 para 34, retração de 6%. Nos demais crimes de violência contra a mulher, as tentativas de feminicídio tiveram queda em abril (54,2%), devido, em parte, ao aumento dos casos consumados. Ainda houve alta nos registros de ameaça (7%), lesão corporal (4,3%) e estupros (12,6%). As autoridades avaliam possível reflexo de aprofundamento na subnotificação em abril do ano passado, devido ao início da pandemia. Já o acumulado desde janeiro aponta um cenário inverso: a comparação com 2020 mostra queda nas ameaças (11,9%), lesões corporais (14%) e estupros (1,4%), mas alta nas tentativas de feminicídios (7,8%).

Ana Souza

[email protected]