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Falta de médicos pelo Ipergs continua indefinida

Everson Boeck
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Depois do descredenciamento em massa, em novembro do ano passado, de médicos pediatras do Instituto de Previdência do Estado do Rio Grande do Sul (Ipergs) que atuavam em Santa Cruz do Sul, revoltados, usuários solicitaram que a Câmara Municipal de Vereadores interviesse na questão. Na última quarta-feira, 26, o Legislativo recebeu representantes da classe médica e da instituição que, durante mais de duas horas, discutiram e expuseram seus argumentos, porém nenhuma ação prática para a solução do problema foi apresentada.
A Audiência Pública, promovida pela Comissão de Saúde, Ação Social e Meio Ambiente da Câmara de Vereadorese solicitada pela Vereadora Rejane Henn, foi acompanhada por cerca de 40 usuários do serviço.Segundo a presidente da Comissão, vereadora Solange Finger, o IPE tem 80 profissionais credenciados em Santa Cruz do Sul, para atender aproximadamente 6,4 mil usuários. No entanto, existe um problema pontual em relação ao atendimento de médicos da área da pediatria. Além disso, outras especialidades estão sem médicos atendendo pelo serviço no município.
De acordo com diretor-médico do Ipergs, Antonio de Pádua Vargas Alves, já foram realizadastratativas com a direção do Hospital Santa Cruz (HSC) buscando a assinatura de um convênio global que garantiria o atendimento junto à Instituição de saúde. Neste novo modelo, o pagamento não seria feito diretamente aos médicos e qualquer profissional do corpo clínico, credenciado ou não ao Ipergs, poderia prestar atendimento. No entanto, segundo o diretor administrativo do HSC, EgardoKuentzer, a proposta foi rejeitada, visto que os profissionais discordam dos valores repassados por consulta e condicionam o atendimento a uma suplementação de valores. “Este modelo criaria encargos que o hospital não tem como assumir”, resume.
O diretor-médico do Ipergs, porém, reconhece as queixas dos médicos e explica que tais reclamações estão relacionadas ao padrão de remuneração do Ipergs, uma vez que a tabela de valores não tem reajuste desde agosto de 2011. Para ele, o problema não representa uma questão administrativa da instituição. “Os senhores mesmos (os usuários), colocaram que há médicos na região que desejam se credenciar ao Ipergs e que em outros municípios, inclusive na região, não há problemas de profissionais se descredenciando em massa. Me parece, então, que a questão é que os médicos daqui não querem trabalhar pelo Ipergs. Nossa instituição está sempre aberta para novos profissionais, mas não temos como obrigar os médicos a trabalhar”, coloca.
Um reajuste na tabela de valores, principalmente no pagamento de consultas é inviável neste momento, conforme Alves. “Existem médicos que aceitam trabalhar recebendo R$ 47 por consulta. A classe dos pediatras se uniu e pediu o dobro. Primeiro por ser proibido pelo Ipergs pagar um valor para médicos de uma cidade diferente dos de outra sendo a mesma especialidade e, segundo, um reajuste desta magnitude é impossível”, informa. Além disso, conforme o representante do Ipergs, a pediatria vem enfrentando problemas em todo o Brasil há anos, porém tem se acentuado recentemente.
Para o diretor do Sindicato Médico do Rio Grande do Sul (Simers), Jorge Luiz Eltz de Souza, que defende a classe médica, se não houver revisão dos valores é possível que os descredenciamentos prossigam. “A tabela está defasada. Todos os profissionais de todas as categorias recebem reajuste, por que isso não está ocorrendo no Ipergs? A tabela é de 1973. De lá para cá a tecnologia evoluiu e outros serviços surgiram, se tornando mais caros”, esclarece. Segundo Souza, a defasagem chega a 50% em comparação com alguns procedimentos da Classificação Brasileira Hierarquizada de Procedimentos Médicos. “Um parto normal, por exemplo, o Ipergs paga R$ 336 sendo que a CBHPM determina o valor de R$ 648. É claro que, sem preços atrativos nenhum profissional vai querer trabalhar”, aponta.
Em 12 de dezembro de 2013, o Simerspublicou nota nos jornais comunicando que Santa Cruz do Sul não teria mais atendimento pediátrico ambulatorial devido ao pedido de descredenciamento dos profissionais. O comunicado associou a saída à política dos atuais gestores de desvalorização dos prestadores e alertou que os descredenciamentos poderiam continuar caso o “governo não volte a tratar o Ipergs como prioridade”. Congelamento de honorários (o IPE-Saúde tem o valor mais baixo de consulta entre planos e que não muda desde 2011) e tabelas defasadas de rol de procedimentos e valores geram o afastamento crescente de profissionais, segundo a nota.
Ao usarem a tribuna, alguns usuários que acompanharam a audiência pediram à direção do Simers e do Ipergsmaior fiscalização dos profissionais. “Fazemos um apelo para que os órgãos façam uma fiscalização intensa, pois sabemos de denúncias de cobranças indevidas por partedos médicos. Vemos diversas especialidades, como os anestesistas, por exemplo, cobrando absurdos. O Ipe precisa achar uma saída, mas a classe médica também precisa descer do ‘Olimpo’, porque no meio desta guerra nós, que temos nossas contribuições descontadas mensalmente, pagamos o pato”, argumenta Daniela Peretti, membro da direção central do Cpers/Sindicato e do conselho consultivo do Ipergs.
A diretora do 18° Núcleo do Cpers/Sindicato de Santa Cruz do Sul, Miriam Neumann Trindade, cobrou do Ipergs a substituição dos médicos descredenciados e criticou a postura da classe médica sobre as remunerações. “Sabemos que a profissão é importante, mas a educação e a segurança também são e nem por isso deixam a população sem atendimento. Essa coisa de uma profissão ser mais importante que outra é ‘balela’, desculpe. Além disso, não venham aqui falar de salário ruim porque disso nós, professores, entendemos muito mais que o médico mais pobrezinho”, sinaliza. Outros participantes chegaram a mencionar formação de cartel e pediram maior fiscalização.

Rolf Steinhaus

A Audiência Pública foi acompanhada por cerca de 40 usuários do serviço