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Quanto nos vale o sublime?

Joshua Bell é uma dos maiores violinistas do mundo. Já foi professor na Royal Academy of Music em Londres, e no Massechusetts Institute of Technology nos Estados Unidos. Bell usa um violino feito em 1713, que comprou por cerca de 3,5 milhões de dólares. A primeira gravação com este violino, “Romance of the Violin”, vendeu mais de 5 milhões de cópias e permaneceu no topo do ranking de músicas clássicas por 54 semanas.
O jornal Washington Post teve a iniciativa de convidar Jushua Bell para tocar anonimamente em uma plataforma de um metrô no centro de Washington, nos Estados Unidos. Era hora do “rush” numa manhã fria de inverno, era intenso o movimento. Ele tocou seis peças de Bach durante 45 minutos. Somente seis adultos pararam por um momento para assistir. Várias crianças tentaram parar, mas, invariavelmente, seus pais as puxaram para que continuassem caminhando. Três dias antes de tocar no metrô de Washington parecendo um mendigo, Bell havia se apresentado a um público que lotou o Boston Simphony Hall com ingressos vendidos a U$ 100,00, um preço alto mesmo para os padrões americanos. Com o estojo do violino aberto no chão para que as pessoas depositassem ali doações enquanto Bell tocava no metrô, ele conseguiu arrecadar apenas U$ 32,00 doados por cerca de 20 pessoas entre as cerca de 1.000 que ali passaram (U$ 52,00 se contar os U$ 20,00 doados pela única pessoa que o reconheceu, uma mulher). Não recebeu nenhum aplauso. Verifiquei na internet que haverá um show de Joshua Bell no Carnegie Hall, em Nova York, dia 12 de novembro deste ano, 2013. Os preços variam de U$ 105,00 a U$ 521,00 de acordo com a localização da poltrona. Quem estiver interessado terá que comprar logo o ingresso, antes que se esgotem.
A história ocorrida no metrô de Washington, descrita acima, aconteceu em 12 de janeiro de 2007. Foi proporcionado pelo jornal Washington Post como parte de um experimento social sobre percepção, gosto e prioridade das pessoas. A conclusão desta experiência foi uma pergunta: “Se nós não podemos parar um momento para ouvir um dos melhores músicos do mundo tocando a melhor música já escrita, quantas outras coisas nós também estamos perdendo?”.
Dia 28 de julho, mês passado, assisti ao espetáculo “Mais ou Menos… Amor” no Teatro do Colégio Mauá, em Santa Cruz do Sul, encenado pela Companhia de Base do Open Extreme Brasil, um centro de arte e excelência em danças da mesma cidade. O espetáculo apresentou um ótimo gosto musical, e muitos bailarinos de uma complexidade técnica lapidada por muito, muito treino e talento. O que foi visto no palco foi uma entrega à arte. O valor do ingresso era simbólico, para um espetáculo digno de qualquer metrópole, onde custaria muito mais. Merecia terem se esgotado os ingressos, e com lista de espera para reserva dos ingressos aos próximos espetáculos. Mas não estava lotado. A única coisa que se podia lastimar naquele momento era a ausência de mais pessoas que gostamos, as quais não estavam presentes para conosco dividir as emoções do encantamento.
Dia 13 de agosto a mesma Companhia de Base do Open Extreme Brasil voltará ao mesmo palco, no Teatro do Mauá, ao lado de artistas de renome estadual e nacional. Não é por nada que o espetáculo musical se chamará “Pela Vida”. A renda obtida será em prol do Centro de Oncologia Integrado (COI) do Hospital Ana Nery, um centro que é referência regional em tratamento de câncer, e acolhe pessoas acometidas pela doença vindas de muitas cidades. Quanto ao espetáculo, haverá duas sessões no mesmo dia, possibilitando que muito mais gente ajude tantos a viver com mais gosto e por mais tempo. Quanto a nós, se não tivermos gosto ou tempo para apreciarmos o sublime, quantas outras coisas também podemos estar perdendo?