Início Geral Repetição até a exaustão leva à perfeição

Repetição até a exaustão leva à perfeição

Luana Ciecelski

Entradas em favelas e capturas de criminosos com ou sem reféns fazem parte do treinamento

Luana Ciecelski
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Apesar de treinar para o caso de uma guerra acontecer – aquele treinamento que se vê em filmes, onde o soldado rasteja na lama – a função do Exército Brasileiro não é apenas treinar para combates militares, mas também para lidar com situações próximas da nossa realidade, como o combate urbano, o cuidado com as fronteiras do país, tráfico de drogas e a criminalidade em larga escala como acontece em grandes cidades, entre outras situações atípicas.
Se os treinamentos são muitas vezes rigorosos, e os soldados passam por situações extremas como fome, frio, sede e cansaço, por outro lado aprendem a valorizar as coisas mais simples e readquirem valores que muitas vezes foram deixados de lado. São, segundo os próprios militares, prós e contras que só entende quem passa por um treinamento militar.
Assim como em todo o país, ele dura um ano e é chamado de Plano Padrão de Ensino Básico. Ele é dividido em duas etapas. Um período básico e um período de qualificação. No período básico, é formada a parte comum a todos os militares, as atividades básicas como o fardamento, marcha, regras básicas de convivência e que fazem parte da rotina de um soldado gaúcho tanto quanto de um baiano.
Já a parte de qualificação é mais voltada para a especialidade do batalhão em que se está. No caso do 7º Batalhão de Infantaria Blindado (BIB) de Santa Cruz do Sul, como o nome já diz, a especialidade é o trabalho com blindados. Além disso, nesse segundo período são passadas diversas instruções de garantia da lei e da ordem, que é uma das principais funções do exército no país atualmente.
De acordo com o Aspirante Felipe de Souza Rodrigues, um dos instrutores do 7º BIB, o soldado entra com uma visão, e chega ao fim do ano com uma perspectiva totalmente diferente da vida. “O exército brasileiro lida com pessoas, e por isso não trabalha apenas a formação militar do soldado, mas também o cidadão. Esse é um dos objetivos principais dos instrutores. Queremos que o jovem saia daqui diferente, sendo uma boa pessoa”, explicou.
Essa mudança acontece, porque sim, os soldados passam trabalho, fome, sede, e com isso, passam a dar valor para coisas pequenas, como um copo d’água, um chuveiro com água quente, um colchão e uma coberta. Além disso, alguns valores que se perdem com o passar dos anos são exercitados e retomados dentro do quartel. A punição para uma mentira, por exemplo, é a prisão. No início isso pode ser um choque até que o jovem se acostume. Esse é um período chamado de internato, onde é feita, como os próprios militares chamam, uma “lavagem cerebral” para que as regras se tornem parte da rotina do jovem. Para os militares, apensar de parecer difícil, ou cruel, tudo é parte do treinamento, pois a pessoa se torna mais consciente.


Apesar de existir o risco, que é da própria profissão, todo um padrão de segurança é adotado sempre

Na prática: uma experiência única

O treinamento dos soldados é feito em equipes, para que cada um dos instrutores passe as atividades para um grupo não muito grande de soldados. Dessa forma, cada instrutor consegue avaliar melhor cada jovem e conhecer melhor suas habilidades e dificuldades. Além disso, todas as instruções seguem um planejamento do exército. Dessa forma as instruções que um soldado está tendo aqui no Sul, são as mesmas que os soldados estão tendo no norte. O que muda é a qualificação. “No norte é selva, no sudeste é parte urbana e no sul é a parte dos blindados, por exemplo”, explicou Rodrigues. “Esse é uma forma de garantir que em caso de guerra, todos os soldados do Brasil estejam preparados para atuar da mesma forma”, completou.
Segundo o Aspirante a Oficial, toda atividade militar é uma atividade de risco, mas os militares acreditam que “é inaceitável que um militar se machuque em tempo de paz”.
Se isso acontece é porque houve uma falha, normalmente do indivíduo que não seguiu as instruções de segurança.
Rodrigues explicou ainda que todo o treinamento é feito de acordo com uma tabela, que leva em consideração uma evolução da dificuldade. Nenhum soldado chega ao quartel fazendo uma atividade com um grau de dificuldade além das capacidades. O treinamento de embarque e desembarque em veículos em movimento, por exemplo, é feito centenas de vezes com o veículo parado até que se possa passar para a etapa seguinte. Além disso, todos os soldados fazem treinamento físico/militar que possibilita uma evolução física que acompanhe a evolução técnica e todo o treinamento de maior dificuldade é realizado com equipes médicas por perto e com os devidos cuidados e equipamentos de segurança.
Para o soldado Rodrigo José Weber, de 18 anos, o quartel está sendo uma experiência única. “Esperava que fosse difícil de superar as coisas, e eu vi que é realmente difícil. No começo a gente não sabe nada e tem que aprender até a marchar, além da disciplina que é uma coisa muito forte aqui dentro, e como proteger o quartel. E isso é muito importante, porque quando sair, a gente vai ter uma formação boa [como pessoa]”.
Atualmente todos os militares são treinados para agir em situações que vão desde abordagens de carros, revistas a suspeitos, prisões em flagrante, até entrada em favelas, bombardeios, cercos, captura de criminosos, crimes onde há reféns, além é claro, de situações de emergência como alagamentos de cidades e dezenas de outras situações atípicas, como a própria Copa do Mundo.


Atividades possuem um padrão nacional seguindo uma tabela de dificuldades que vão aumentando conforme a prática dos soldados