
Sara Rohde
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Há doze anos foi sancionada a Lei Maria da Penha. A partir de 7 de agosto de 2006 que as mulheres tiveram voz e vez para finalmente serem justiçadas. Até então, não havia uma regulamentação que pudesse protegê-las das agressões machistas, tanto físicas, como verbais e psicológicas. A Lei nº 11.340 visa proteger a mulher da violência e ganhou este nome devido à luta da farmacêutica Maria da Penha Maia Fernandes, agredida severamente pelo seu ex-companheiro. Apesar da lei, infelizmente este ato covarde ocorre diariamente no mundo, no Brasil e em Santa Cruz do Sul.
E neste ano mais uma mulher foi vítima de feminicídio em Santa Cruz, a segunda desde janeiro. Um caso recente, ocorrido nesse domingo, 12, nas proximidades do Lago Dourado. Francine Ribeiro, de 24 anos, havia saído para caminhar no início da tarde quando não retornou para casa. Familiares foram atrás da vítima e infelizmente encontraram o corpo na manhã dessa segunda-feira, 13. Conforme a delegada Lisandra Carvalho, da Delegacia Especializada em Atendimento à Mulher (DEAM), a vítima foi encontrada com visíveis sinais de esganadura. “A vítima tinha manchas ao redor do pescoço e estava deitada, com as mãos amarradas. A necropsia vai dar a real causa da morte. O departamento de criminalística foi acionado para comparecer ao local e realizar o exame pericial. O horário, bem com um norte de como ocorreu a morte, somente o exame feito pelo médico legista poderá constatar. A vítima foi localizada em um ponto muito distante da margem do lago, um local realmente distante. O que podemos concluir inicialmente é que a jovem foi caminhando até o local, sob ameaça, talvez de arma de fogo ou faca. É inviável alguém ter carregado a vítima até onde ela foi encontrada. Tudo indica que a morte foi no mesmo lugar onde o corpo estava. Esta é a minha impressão”, explicou Lisandra. A delegada ainda afirmou que houve bastante dificuldade para chegar ao local do crime, “muita subida e banhado, um local totalmente difícil de ter acesso”.
A vítima não estava com o celular quando foi encontrada, e a família conseguiu rastrear diversos pontos onde o GPS esteve durante o domingo. A DEAM está investigando o caso. “Vamos refazer a rotina da Francine, com quem ela estava por último, de onde ela veio, quais eram as intenções. Um caso muito intrigante”, frisou Lisandra.
Pela forma que o corpo foi encontrado não havia sinais de violência sexual, “ela estava vestida, de calça, com a blusa amarrada na barriga, tudo está sendo investigado. Estamos trabalhando com a hipótese do feminicídio e com a hipótese remota de latrocínio, pois o celular foi levado”, completou a delegada.

Lisandra ainda afirmou que pode ter ocorrido resistência por parte da vítima, devido as marcas em sua barriga, que aparentam ser socos, algo neste sentido, concluiu.
Lei Maria da Penha e sua origem: A história da Maria da Penha iniciou em Fortaleza (CE), sua cidade natal. Em 1983, com 38 anos de vida, ela sofreu uma tentativa de homicídio, foi quando seu infeliz ex-marido tentou matá-la com um tiro de espingarda. O mesmo fora encontrado na cozinha, de pijama e com uma corda no pescoço, dando a entender ser vítima de um suposto assalto. Por sorte, Maria não morreu, mas a forte agressão a deixou paraplégica. Após quatro meses entre a vida e a morte, Maria da Penha retornou para casa de cadeiras de rodas, e ainda assim, sofreu outra tentativa de homicídio, dessa vez seu ex-marido, Marco Antonio Heredia Viveros, tentou eletrocutá-la no chuveiro.
Em 1994 Maria da Penha publicou o livro “Sobrevivi… posso contar”, onde narra as violências sofridas por ela e pelas três filhas. Sem perder a esperança, a vítima ainda acionou o Centro pela Justiça e o Direito Internacional (CEJIL) e o Comitê Latino Americano e do Caribe para a Defesa dos Direitos da Mulher (CLADEM). Em 1998 os órgãos encaminharam o caso para a Comissão Interamericana de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos (OEA).
A prisão de Marco veio apenas em 2002, e ele cumpriu menos de um terço da pena. Depois, foi transferido para o regime semiaberto em Natal (RN). A prisão só aconteceu após a Corte Interamericana de Direitos Humanos condenar o Estado brasileiro por omissão e negligência. Em 2006, o então presidente Luís Inácio Lula da Silva, sancionou a lei que defende as mulheres. Mas a violência ainda é sentida por muitas delas no Brasil.
Um levantamento realizado em abril deste ano apontou um dado assustador, o número de notificações de casos de violência contra as mulheres subiu de 75 mil em 2011 para 211 mil em 2017. De 2011 a 2015, foram registrados 5.733 óbitos de mulheres vítimas da violência, e deste total, 63% aconteceram dentro de casa, sendo 19% com histórico de repetição da violência. Somente nos primeiros seis meses deste ano, 72.839 denúncias foram registradas através do 180, número da Central de Atendimento à Mulher em Situação de Violência. Dados da Organização das Nações Unidas (ONU) ainda mostram que 35% das mulheres do mundo são vítimas de violência física ou sexual.
Apesar da Lei Maria da Penha o Brasil é o 5º país que mais apresenta feminicídio no mundo. E só em Santa Cruz do Sul, segundo a Delegacia Especializada em Atendimento à Mulher (DEAM), de janeiro até julho de 2018, 814 ocorrências foram registradas, uma média de 135 por mês. Deste número, 273 ocorrências são ameaças, 156 são lesões corporais e 14 presos em flagrante. Outro levantamento impressionante é o número de medidas protetivas, há 95 deferidas e 312 indeferidas. Ou seja, nem todos os casos de violência poderão ser solucionados.
Em julho deste ano outro feminicídio foi registrado, um caso que intrigou a comunidade santa-cruzense. Jéssica Aline Junkherr Pinheiro foi assassinada com dois tiros no rosto no mês passado. O crime ocorreu junto ao Cemitério Parque Guarda de Deus. Agora, este número subiu, sendo duas vítimas de feminicídio em Santa Cruz. Até quando as mulheres poderão andar despreocupadas pelo município?

Patrulhamento: Na última quarta-feira, 8, o Comando do 23º BPM realizou reunião sobre a Patrulha Maria da Penha de Santa Cruz do Sul. Na ocasião foi implantada uma nova guarnição policial para reforçar a segurança e possibilitar uma maior abrangência nos atendimentos às vítimas. A Patrulha Maria da Penha da Brigada Militar é desencadeada semanalmente no município, através de uma viatura especial composta por dois ou mais policiais militares, sempre acompanhados de uma policial feminina, com o objetivo de realizar visitas àquelas mulheres que obtém e já obtiveram medidas judiciais de proteção. Às vítimas receberão informações que necessitarem e terão monitoramento de modo ostensivo.
Domingo de ocorrências Maria da Penha: Nesse domingo de Dia dos Pais, duas ocorrências foram registradas. Em uma delas, a Brigada Militar de Santa Cruz do Sul (23°BPM), foi despachada pelo Centro integrado de videomonitoramento, comando e controle, ao Bairro Santa Vitória. Segundo relato da vítima, o acusado havia saído da residência no sábado à noite e retornado no domingo ameaçando-a de violências físicas e ofendendo a vítima. Relata ainda, que este fato já se repetiu outras vezes.
A outra ocorrência aconteceu na noite do domingo. Segundo a Brigada Militar, Policiais Militares da segunda companhia, foram despachados através do Centro integrado de videomonitoramento, comando e controle, para atendimento de ocorrência Maria da Penha, onde o pai estaria agredindo a filha de 14 anos. O individuo se encontrava ao lado de fora da residência (bairro Esmeralda), com visíveis sinais de embriaguez. O acusado violentou a vítima com socos e tapas, ameaçando de matá-la. Depois de contido o acusado continuou relatando aos policiais que iria realmente matar a filha.
Descumprimento da Medida Protetiva
De acordo com o art. 24 – A, acrescentado pela Lei 13.641/18 na Lei Maria da Penha, agora é crime – punido com detenção de 3 meses a 2 anos – descumprir medida protetiva de urgência.
Desta maneira, caso haja o descumprimento, além de ser possível a decretação da prisão preventiva, nos termos do art. 313, III, do Código de Processo Penal, o agressor pode ainda, responder por crime, previsto e tipificado.
Entre as agressões previstas na Lei Maria da Penha estão:
I – Violência física, entendida como qualquer conduta que ofenda sua integridade ou saúde corporal;
II – Violência psicológica, entendida como qualquer conduta que lhe cause dano emocional e diminuição da autoestima ou que lhe prejudique e perturbe o pleno desenvolvimento ou que vise degradar ou controlar suas ações, comportamentos, crenças e decisões, mediante ameaça, constrangimento, humilhação, manipulação, isolamento, vigilância constante, perseguição contumaz, insulto, chantagem, ridicularização, exploração e limitação do direito de ir e vir ou qualquer outro meio que lhe cause prejuízo à saúde psicológica e à autodeterminação;
III – Violência sexual, entendida como qualquer conduta que a constranja a presenciar, a manter ou a participar de relação sexual não desejada, mediante intimidação, ameaça, coação ou uso da força; que a induza a comercializar ou a utilizar, de qualquer modo, a sua sexualidade, que a impeça de usar qualquer método contraceptivo ou que a force ao matrimônio, à gravidez, ao aborto ou à prostituição, mediante coação, chantagem, suborno ou manipulação; ou que limite ou anule o exercício de seus direitos sexuais e reprodutivos;
IV – Violência patrimonial, entendida como qualquer conduta que configure retenção, subtração, destruição parcial ou total de seus objetos, instrumentos de trabalho, documentos pessoais, bens, valores e direitos ou recursos econômicos, incluindo os destinados a satisfazer suas necessidades;
V – Violência moral, entendida como qualquer conduta que configure calúnia, difamação ou injúria.
Alerta 180
Se você mulher sofre qualquer tipo de violência, ligue imediatamente para a Central de Atendimento à Mulher em Situação de Violência, através do número 180.
6.436 casos em quatro anos
Ocorrências registradas por mulheres vítimas da violência em relação aos outros anos em santa Cruz do Sul:
2017 – 1.506
2016 – 1.509
2015 – 1.676
2014 – 1.745














