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Complexo de vira-lata (2)

Chama atenção a força do complexo de vira-lata por esses meses que antecedem a Copa do Mundo 2014. Nas redes sociais e na mídia pululam comentários que reforçam o sentimento de inferioridade do tipo “era de se esperar que no Brasil fosse assim”, “num país sério isso não acontece”, e assim por diante.
Há quem seja sincero ao expressar esse sentimento de inferioridade e há quem faz dele um recurso retórico para criticar o atual governo. No primeiro caso, cabe levar em conta que as pesquisas das ciências sociais captaram claramente nas últimas décadas que muitos brasileiros consideram-se parte de um povo inferior. No segundo, trata-se de uma esperteza política: críticos conservadores e/ou direitistas batem nas mazelas do governo recorrendo ao jargão “tudo continua igual”, ou “mudou para pior”.
Mas, na real, faz sentido esse complexo de vira-lata hoje? É claro que não!
Temos todos os motivos para nos considerarmos parte de um povo tão capaz quanto qualquer outro, diferentes, mas com forças e fraquezas como todos os demais. A ideia de que uns povos são melhores que outros tem nome: etnocentrismo. Historicamente foi construída aqui a ideia de que deveríamos nos espelhar nos modelos europeu e norte-americano. É preciso acabar com essa visão colonial, porque o século XXI será bem diferente dos padrões europeus e norte-americanos que fizeram sucesso no século passado.
Convém recordar: somos uma das maiores economias do mundo e fortes competidores no cenário global; somos um povo admirado pela cordialidade,  alegria, capacidade de improviso, música e artes, associada em grande parte à miscigenação étnica; somos um país-continente, com grande diversidade regional, com abundantes águas e rica biodiversidade; somos uma das maiores democracias do mundo, com uma Constituição avançada, eleições regulares e ampla liberdade de expressão (ao ponto da grande mídia se achar no direito de dizer qualquer coisa dos governantes sem receio nenhum).  Vivemos nossa mais longa fase democrática.
O país mudou para melhor neste início de século. Parte das elites e da mídia não quer reconhecer isso, pois isso seria dar um crédito político às forças de esquerda que coordenam o bloco governante.
Negar o complexo de vira-lata não é cair no oposto, uma espécie de “complexo pavão”, para ficar em analogias do reino animal. Não temos motivos para nos pavonear, pois continuamos com problemas seríssimos em educação, saúde, segurança, desigualdade social, corrupção, burocratismo. A lista dos nossos problemas e defeitos é longa. O fundamental é perceber que, com nossos defeitos e nossas virtudes, estamos avançando em aspectos fundamentais para o desenvolvimento e a qualidade de vida de vida do nosso povo.
 Ao olhar para os outros povos, buscando aprender com seus acertos e erros, e simultaneamente olhar para o nosso país, para o nosso passado, notamos que há fartas razões  para alimentar um genuíno sentimento de otimismo e auto-confiança.