
Grasiel Grasel
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Já são 7 anos desde uma das maiores tragédias que o Rio Grande do Sul e o Brasil já viveram. Na madrugada do dia 27 de janeiro de 2013, um incêndio na Boate Kiss, em Santa Maria, acabou por tomar a vida de 242 jovens. 680 pessoas puderam ser salvas, mas muitas precisarão conviver com sequelas. Nesta segunda-feira, familiares e sobreviventes se reuniram em Santa Maria para prestar homenagens e pedir justiça. Três dos quatro réus vão a julgamento em março.
No evento intitulado “Janeiro 27 – Sem justiça não há futuro”, organizado pela Associação dos Familiares de Vítimas e Sobreviventes da Tragédia de Santa Maria (AVTSM), pais e sobreviventes se reuniram pelo sétimo ano consecutivo em frente ao que restou da antiga casa noturna, onde um coração foi pintado no asfalto e iluminado com velas. As atividades do grupo tiveram início na noite do domingo, dia 26, e continuaram a partir das 18 horas da segunda-feira, na data que marcou os sete anos do caso.
Caso segue sem punições
Além de terem que conviver com a tristeza de perderem filhos e amigos, os membros da AVTSM precisam suportar a realidade da justiça brasileira, que até o momento não puniu os apontados como responsáveis pela tragédia. Somente dois bombeiros foram condenados por improbidade administrativa, em abril de 2019, por deixarem de exigir dos proprietários da boate um certificado de treinamento de pessoal, no entanto, eles apenas perderam seus direitos políticos por três anos, foram impedidos de realizar contratos com o poder público e tiveram que pagar multa civil equivalente a duas vezes a remuneração que recebiam na época do incêndio.
O primeiro júri dos acusados de serem responsáveis pelo crime foi marcado somente no dia 16 de janeiro deste ano, designado para acontecer no dia 16 de março, às 10 horas, no Centro de Eventos da Universidade Federal de Santa Maria, onde devem ser julgados três dos quatro réus: Luciano Augusto Bonilha Leão e Marcelo de Jesus dos Santos, produtor e vocalista da banda Gurizada Fandangueira, e Mauro Londero Hoffmann, um dos sócios da Boate Kiss.
Já o quarto réu, Elissandro Callegaro Spohr, também sócio da Kiss, será julgado em Porto Alegre, mas ainda não há data definida para o seu júri. Em dezembro de 2019, a 1ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJ-RS) decidiu acatar o pedido da defesa de Spohr pelo desaforamento de seu caso, ou seja, permitiu que ele seja julgado em Porto Alegre e não na comarca de Santa Maria como estava previsto. Os demais réus também estudam pedir transferência.
Família de santa-cruzense quer justiça
O jovem Matheus Raschen, 20 anos, era uma promessa do basquete santa-cruzense, pois chegou a jogar na Seleção Brasileira Sub-18 do esporte. Ele foi uma das vítimas que conseguiu escapar das chamas, mas não das consequências da perigosa fumaça tóxica do incêndio. Depois de ficar internado por cinco dias em um Centro de Terapia Intensiva (CTI), ele faleceu em decorrência de uma parada respiratória. Raschen foi uma das pessoas que arriscaram suas vidas para tentar salvar outras.
Nesta segunda-feira, dia 27, o ‘Riovale Jornal’ conversou com o pai do jovem, Nestor Raschen, que junto de sua mulher decidiu não participar das homenagens em Santa Maria pela primeira vez. “Ir para Santa Maria, que era um lugar de alegria, sempre era motivo de festa, para visitá-lo. Agora a gente vai e não o encontra mais, só encontra um grande grupo de famílias entristecidas e enlutadas, com dor, sofrimento e esperando por justiça”, explica.
Nestor acredita que, além da banda e dos sócios da boate, os poderes públicos municipal e estadual deveriam ser responsabilizados por terem sido “omissos naquilo que deveriam ter exigido para o bom funcionamento do espaço”. “Se era permitido funcionar, é porque alguém autorizou ou fez vista grossa para irregularidades”, afirma. Segundo ele, a falta de fiscalização foi crucial para a forma como a tragédia se desenhou.
A família Raschen, dentro de suas possibilidades, pretende acompanhar o julgamento no dia 16 de março, no entanto, Nestor vê injustiça em caso de transferirem os julgamentos para outras comarcas. “Os fatos aconteceram lá, não existe local mais apropriado para que a justiça seja feita. Seria muito inadequado tirar o júri dessa região, porque lá as pessoas estão mais bem informadas de tudo o que aconteceu”, protesta. Para o pai, é provável que outros desaforamentos sejam concedidos depois do entendimento que beneficiou Elissandro Spohr.
O pai de Matheus faz questão de agradecer toda a solidariedade e apoio que a família vem recebendo dos amigos e da comunidade santa-cruzense nos últimos 7 anos. “Se tem algo que preenche o nosso vazio é o fato de as pessoas serem muito solidárias conosco, com a comunidade querendo que se faça justiça. O bom é saber que nessa caminhada não estamos sozinhos”, agradece.














