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Copa não é questão de patriotismo. O país, sim

A Copa do Mundo de 1970 foi espetacular sob muitos aspectos. Foi a primeira Copa televisionada para todo o país. A Copa de uma das nossas melhores seleções. E a Copa que marcou a ideia de que o futebol nos distingue como nação, que o Brasil é “a pátria de chuteiras”. Isso no período mais duro do regime militar, de repressão e torturas. A conquista do caneco naquele ano serviu admiravelmente aos propósitos do regime militar empenhado em mostrar que estávamos vivendo um grande momento de crescimento econômico e desenvolvimento.
Até hoje nos lembramos do “hino” da copa. “Noventa milhões em ação, pra frente Brasil, do meu coração. Todos juntos vamos, pra frente Brasil, salve a Seleção. De repente é aquela corrente pra frente, parece que todo o Brasil deu a mão. Todos ligados na mesma emoção. Tudo é um só coração! Todos juntos vamos, pra frente Brasil, Brasil. Salve a Seleção!”
Desde então ficou marcada a ideia de que torcer pelo Brasil na Copa é um compromisso cívico, é uma demonstração de patriotismo. Várias propagandas hoje continuam passando essa ideia de que somos “a pátria de chuteiras”. É um acinte à nossa inteligência. É hora de nos livrarmos dessa ideia de patriotismo.
O patriotismo deriva do sentimento de pertencimento e de amor ao país e a seu povo. Esse sentimento pode ser expresso de muitas formas: pela música, pelas artes, pela participação política, pelo cumprimento dos deveres, por manifestações de rua, pela defesa do território e também pelo esporte. Patriota é quem defende e assume suas responsabilidades de cidadão de um país.
 Aos poucos o Brasil vai se livrando da marca de ser o país do futebol e do carnaval e assumindo a marca de ser o país líder da América Latina, um país em desenvolvimento, democrático e defensor de uma nova ordem mundial. Nesse contexto, ao invés de falarmos de “pátria de chuteiras” devemos falar da pátria dos livros, das artes, do trabalho, do orçamento participativo, da diversidade étnica, regional e ambiental.
Há, todavia, uma questão patriótica envolvida na Copa: o cuidado com a imagem do país que vamos transmitir ao mundo. Temos um momento único para mostrar a boa parte do planeta o que somos hoje, com nossas conquistas e nossos problemas. Será anti-patriótico quem se esforçar por passar uma imagem negativa do Brasil, tratar mal os turistas, fizer manifestações violentas, quebrar as regras da civilidade e da boa relação entre as pessoas de todos os povos.
Pessoalmente, vou torcer pela nossa seleção e pelo hexa-campeonato. Não por patriotismo. Vou torcer porque gosto de futebol e porque me identifico em primeiro lugar com as coisas da minha terra. Patriotismo mesmo tento expressá-lo na vivência política e na defesa das coisas do Brasil, no dia a dia.