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Democracias em recessão?

Escrevo desde Montevidéu, onde participo do 9º Congresso Latino-Americano de Ciência Política, cuja temática geral é: as democracias latino-americanas estão em recessão? 

Os problemas da democracia não são continentais, são mundiais. A eleição de Donald Trump, nos Estados Unidos, é apenas um dos símbolos dos ventos antidemocráticos. A “primavera árabe” não passou de miragem. A Europa vem sendo sacudida pela crise econômica e imigração em massa. Na África e na Ásia, as condições para regimes democráticos existem apenas em algumas partes.

Na América Latina, os ventos democráticos do início do Século 21 trouxeram expectativa de avanços inéditos com governos de inclinação à esquerda. Os governos de Lula, no Brasil, Cristina Kirchner, na Argentina, Fernando Lugo, no Paraguai, Pepe Mujica, no Uruguai, Hugo Chávez, na Venezuela, Evo Morales, na Bolívia, cada qual com características peculiares, buscaram combinar crescimento econômico com inclusão social. Os resultados foram distintos, tendo em comum medidas contra o aumento das desigualdades que marca o capitalismo globalizado. 

Dos casos citados, só Bolívia e Uruguai mantêm governos de esquerda. Nos demais, golpes parlamentares-judiciais (Brasil, Paraguai), instabilidade institucional (Venezuela) ou guinada eleitoral à direita (Argentina). O panorama mudou. Os pesquisadores reunidos aqui não têm um diagnóstico único para essa mudança, mas entre os fatores apontados nos estudos sobressaem-se a crise econômica mundial, a desconfiança dos cidadãos nos políticos e nas instituições políticas, as fragilidades dos partidos e governos de esquerda darem conta das demandas dos cidadãos em sociedades que mudam rapidamente.

O local do evento carrega um simbolismo interessante: o Uruguai é um país com uma democracia estabilizada, governada desde 2005 pela Frente Ampla, uma coalizão de partidos de esquerda, que fazem uma gestão que alia gestão econômica relativamente ortodoxa, crescimento econômico moderado, redução da pobreza e garantia das liberdades democráticas. No atual estágio das democracias, é uma conquista a ser festejada.