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Zoreia: caminhos e passagens!

Zoreia, tua foto estampada nos jornais e na internet, com manchetes que noticiavam tua morte, correram o mundo e chegaram também a mim, aqui em Brasília. Fiquei triste! Lembro-me do dia que te conheci, como um jovem estudante, no convívio com tua família, aí no Pinhal Santo Antônio. Na verdade, menino ainda, tu participavas das nossas conversas e cantavas com a gente, em animadas rodas de viola, músicas que traduziam sonhos e esperanças. Aprendi a te conhecer como Júlio, um menino da roça, criado em família boa, de respeito, honesta e trabalhadora. Mas ainda em 2004, acompanhei com tristeza teu envolvimento com uma quadrilha do crime organizado, resultando na tua prisão.
Agora, teus últimos feitos me trazem questionamentos, mais angústia e muita vontade de entender os reais motivos do teu envolvimento nesse mundo fora da lei. E me levam a te reconhecer num misto de culpa e vitimação. No delito, que se tornou crime, está tua culpa. Na permissão para ser usado pela máfia perversa do crime, está a tua vitimação. Vejo-te em situação inegável de quem precisou ser sentenciado pela Justiça, conforme os parâmetros da lei. Mas, vejo-te também como vítima, mais uma vítima, a ponta desprotegida de um iceberg poderosamente estruturado para driblar e ferir a lei e as pessoas.  Ou será que tu já vieste ao mundo predestinado a pegar nas armas da morte, dirigir os carros das gangues, explodir pontes, assaltar bancos? É óbvio que não. Foram interferências e influências externas que te coagiram a tais atos. Tu te deixaste usar pelo crime organizado, e passaste a fazer parte dele. Um mundo excitante e deslumbrante, certamente. Adrenalina pura. Poder financeiro. Violação das regras, na criação e afirmação das próprias regras. Mas, um mundo falso. Uma vida marcada para ser curta. Um tempo marcado para ser trágico. Uma escolha errada, focada naquilo que deveria ser sempre evitado. Um glamour momentâneo, nebuloso e cegante. Um caminho cruel e desumano, comandado por “gente da alta”, sabidamente orquestrado por alguns indivíduos da fina linhagem social, onde você foi usado.
Enfim, Zoreia, agora você se foi! Se foi ainda tão jovem. Cedo demais para quem deveria viver bem uma vida toda. Cedo demais para um guri serrano que deveria estar abraçado em sua família, junto com a sua gente. Cedo demais para um jovem que ainda poderia escolher tantos caminhos para uma vida plena em alegrias e realizações. Infelizmente, já é tarde demais! Que esta tua passagem faça eco na consciência da nossa juventude, para que percebam que o mundo do crime é maldito, perigoso e pode ser um caminho sem volta. Que os jovens compreendam cada vez mais que o envolvimento com bandos de mafiosos escurece o caminho, tira o brilho da vida e apaga o facho de luz para onde os olhares devem estar voltados a cada dia. Que tua trajetória, Zoreia, sirva para que os governantes percebam sempre mais a necessidade de investir em programas para a juventude, de oportunidades e de acesso aos direitos, à educação, ao lazer, ao esporte, à cultura. Que sirva para que nossas comunidades envolvam os jovens cada vez mais em ações que consolidem a fraternidade, a união e a participação cidadã. Que tua passagem, Zoreia, sirva para que todos nós tenhamos consciência de que temos uma missão aqui nessa esfera da existência, e que essa missão deve ser cumprida da melhor forma. Que nos unamos na construção da paz! Esteja onde estiver, meu caro, peço a Deus que te abrace!

*Professor; assessor da Secretaria Nacional de Juventude, da Presidência da República – [email protected]